A vida é como um jogo diário de personagens surrealistas e ambíguas que se me atravessam e que tenho a necessidade de as inscrever. Pequenos momentos que narro, por vezes peças que são fundamentais do meu dia a dia, amigos que me acompanham, animais que voam, seres que todos querem calar, mas as vozes urram e as imagens vibram nas paredes que passo, às vezes encontro-me em sombras, em espaços estranhos e esguios. Estas imagens que surgem constantemente em todos os cantos são pequenas narrativas, catarses que tenho a necessidade de agrupar e de compor e de revelar suas brincadeiras e suas ironias.
O jogo surge como a impossibilidade, como uma provocação findável e impossível, sendo um pensamento, um movimento circular, onde à partida não se esgotam as hipóteses de sequência de jogo constante, em loop torna-se um circuito fechado, onde todas as hipóteses estão esgotadas pela insatisfação e ruptura do próprio jogo.
As palavras pronunciam-se silenciando-as à partida pelo desenho, pela mutação e transformação das mesmas, logo a inscrição da palavra é um desenho e o desenho talvez uma frase. O primeiro olhar não pode ser reconstruído, tem que ser tatuado como se na pele pertencesse.
O Primitivismo das figuras, surge como ruptura dos tempos e como uma necessidade de inscrição como se a tela fosse um mural fosse um espaço infinito e um cronograma desdobrável e a incisão dos hábitos quotidianos e apropriação constante de tudo o que é vivido sentido e olhado tem que ser imediatamente inscrito, as formas tornam-se cada vez mais infantis e expressivas e as figuras constantemente expressivas tem uma necessidade de se afirmar, umas em narrativas lúdicas e fantasmagóricas e outras da minha realidade onde tudo pode ser consumido, estas mesmas narrativas na medida que a tela avança agrupam-se, construindo os labirintos das minhas próprias "não composições".
(Texto: Declaración de la artista Vera Midões)